Agradeço a Jorge Pereira a oferta ao ARQUIVO EPHEMERA do conjunto do processo de despedimento na Semicondutores/Standard Eléctrica, com uma nota de sua autoria sobre um dos despedimentos colectivos mais relevantes do pós-25 de Abril:
BREVE INTRODUÇÃO AO PROCESSO DE DESPEDIMENTO NA ITT SEMICONDUTORES/STANDARD ELÉCTRICA APÓS 0 25 DE ABRIL DE 1974
A ITT Semicondutores em Portugal era formalmente uma divisão da Standard Eléctrica, mas toda a sua dependência tecnológica, funcional e de mercado se exercia em relação ao grupo ITT Semiconductors, com fábricas nos EUA, Alemanha e Reino Unido,
A sua implantação em Portugal, Cascais, decorria do baixo custo da mão-de-obra, empregando, no início de 1974, cerca de 1900 trabalhadores.
Com o processo da revolução de Abril, e a consequente afirmação dos direitos dos trabalhadores, incluindo a subida dos salários, a ITT manifestou logo em 1974 a intenção de reduzir efectivos, alegando quebras de mercado externos. Através de incentivos ao despedimento e do alegado panorama de instabilidade foi concretizada a saída de largas centenas de trabalhadores.
Entretanto os trabalhadores e as suas organizações representativas foram tomando consciência de que a Standard Eléctrica e a sua administração se mantinham fora deste conflito, apesar de a ITT Semicondutores em Portugal constituir, à luz da lei, uma Divisão da Standard Eléctrica. Note-se que a separação existente se traduzia por diferenciação nos refeitórios, nos departamentos de pessoal e de contabilidade, em tudo independentes entre as duas partes da empresa. De tal modo que até as Comissões de Trabalhadores nasceram distintas.
A tomada de consciência de que, do ponto de vista legal, a entidade patronal era a Standard Eléctrica, empresa de administração portuguesa, conduziu à constituição de uma comissão de trabalhadores unificada e à responsabilização da Administração da SE como entidade patronal única.
Quando, em 28 de Julho de 1978, à hora de saída dos trabalhadores e consequente encerramento para férias, a Administração manifesta a intenção de despedimento da grande maioria dos cerca de 830 trabalhadores restantes da Divisão de Semicondutores.
Dentro do prazo legal de um mês a comissão de trabalhadores apresentou a sua contestação e durante cerca de 2 anos desenrolou-se um processo de resistência que se considera relevante dar a conhecer, conciliando firmeza com responsabilidade, contestando as alegações da empresa, mas apresentando alternativas, desenvolvendo contactos ao nível do aparelho de estado e de outras entidades externas, incluindo internacionais.
A autorização de despedimentos foi sendo negada por diversos governos, até que as alterações de poder político, já no início da década de 80, conduziram a uma decisão favorável ao despedimento, de natureza claramente política.
2019.12.24
Jorge Pereira (antigo membro das comissões de trabalhadores da ITT Semicondutores e da Standard Eléctrica)
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